terça-feira, 19 de janeiro de 2010
Cidade Morena: ventura e aventura
RELATÓRIO elaborado por Faria, digníssimo senhor Cônsul de Goias,
Cidade Morena: ventura e aventura
Ao som de Reginaldo Sans no PC vejo-me a rememorar os ímpares e inéditos momentos do acampamento rural dos Poetas Del Mundo em Campo Grande, a Cidade Morena do Brasil.
Ventura e aventura nas terras que, entre outras distinções, reverencia a memória de um santo da Igreja Católica de Roma, Dom Bosco, que primou, sobretudo, pela educação em seu país, a Itália, com influência entre seguidores e admiradores por todo o mundo Cristão, inclusive no Brasil. Outro nome lá por muito admirado, Dom Aquino, relembra os tempos em que Mato Grosso do Sul e seu irmão vizinho do norte tinham as mesmas fronteiras, estado uno, embora o sul reivindicasse autonomia, o que chegou na segunda metade do século XX. A exemplo de Dom Bosco, Dom Aquino é também reverenciado na “capital morena” do Brasil.
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Grito da Terra, Preservar para Viver, eis o tema em foco, envolvido também pelo seminário Sinestesia e Poesia.
Na coordenação local do evento, Vanda Ferreira, escudada por Dom Fernando, e, no seminário, a maestria de Nena Sarti, ou “Nena do Papai”.
No comando geral dos Poetas Del Mundo do Brasil, a competência da embaixadora DD-Delasnieve Daspet, com a incondicional parceria de Nelson Vieira, o amigo da comunicação e das letras em Campo Grande e em seu Estado.
O primeiro contato com Bugra, digo, Vanda, foi no encontro de Poetas Del Mundo do Estado de São Paulo, quando do anúncio, por DD, do futuro encontro de Campo Grande. Prometi participação.
Um vez em Goiás, mesmo após ter-me inscrito para o encontro, titubeio. Penso em desistir, deixar de participar, até porque pouco ou quase nada tenho a contribuir. E não é de meu feitio ser apenas número, preenchimento de colunas da estatística.
Chego a anunciar minha quase não ida, mas dois nomes condicionam-me a não desistir: Vanda, cônsul dos Poetas del Mundo do Entorno de Campo Grande, a anfitriã do evento, e Delasnieve, a embaixadora dos Poetas del Mundo do Brasil, cuja ação e atuação, por si só, inspiram a arregaçar as mangas quem com ela convive.
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Bilhete no bolso, partida do ônibus anunciada para as 22h20.
Como já se estigmatizou que brasileiro deixa sempre algo de importância para a última hora, faço jus ao clichê.
Detalhes de malas e bagagem com providências de última hora, fica para trás o lanche preparado para a matula na viagem. Sei de antemão que a lanchonete da rodoviária, a essas alturas, deve estar fechada. Como não jantei, sem lanche vou passar fome.
Antes de Mato Grosso do Sul, passaremos por duas cidades (Itarumã e Itajá), cujas lanchonetes também estarão fechadas quando lá chegarmos, fato comum em cidade pequena do interior de Goiás. Expectativa de lanche só em Cassilândia, em Mato Grosso do Sul.
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À guisa de frasqueira de mão, a maleta-estojo do computador portátil (que, por força alienígena da colonização imperialista, se reconhece por notebook, literalmente livro ou caderno de anotações).
A mala de viagem eu a emprestei para Catarina Maria, a filha que fora passar o natal e a virada do ano com a sogra de minha filha Josy Ires.
Improviso como mala a sacola com rodas e, pelas ruas, arrasto-a por umas cinco quadras até a rodoviária.
Feliz a invenção de rodas em malas e sacolas.
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A aventura promete agito de adrenalina a partir do atraso do ônibus da linha Brasília-Campo Grande com escala em Caçu (ou Cassu?).
Aos primeiros minutos de atraso, compreensível tolerância, que se esvai à medida em que os ponteiros registram a ampliação do atraso.
Dez, vinte, trinta minutos e nada de ônibus. Passageiros que viajariam mais tarde, um após outro, embarcam-se e partem (embarcar não é entrar no barco?). Eu, com o bilhete no bolso, ainda a esperar. E a fome a aumentar.
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A agente do guichê do ônibus encoraja-me a me deslocar até meu escritório, onde esqueci o lanche preparado para a viagem. Se nesse ínterim chegar o ônibus ela o fará esperar por mim.
Chamo um mototaxista (mesmo não apreciando essa estrovenga de duas rodas), sento-me na garupa e zarpamos.
Já à porta do escritório, a desencorajadora lembrança: a chave havia ficado na mala, na rodoviária. E então, adeus lanche!
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De volta na mesma moto, algumas tentativas por alguns bares da cidade.
Talvez compre um pacote de bolachas, preferencialmente salgadas, porém, na falta desta, qualquer outra serve.
Um bar, outro bar, um terceiro... nada para se comer encontro em nenhum deles. E a fome a aumentar.
Decepção: que cidade é essa em que só se vende cachaça ou cerveja nessa hora da noite?
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De novo na rodoviária, a continuada espera. Os ponteiros denunciam mais de uma hora de atraso.
Passados uma hora e meia, eis que chaga o ônibus. Ufa!
Até que finalmente vejo-me de saída, com esperança de lanchar em Cassilândia.
Acomodo-me na poltrona 13, naquela hora já na sexta feira do dia 8 (e se fosse dia 13?).
Ajeito o protetor de pescoço para tentar dormir. Com isso tento tapear a fome.
Mas não durmo. Ficam para trás o rio Verdinho, Itarumã, o rio Corrente, Itajá. Tudo passa, menos a fome.
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O descortinar das luzes de Cassilândia mexe com o estômago. Como se diz na sinestesia, já percebo o cheiro e o sabor de iguarias que hão de me matar a fome. Salgados, sanduíches, bolachas, biscoitos, qualquer coisa.
Caso não tenha suco natural, sem problema. Agrada-me também guaraná e até água mineral recebo de bom grado. Qualquer coisa que me ajude no processo de ingestão. Porém, na falta de líquido, o lanche vem bem até mesmo seco. Não quero é essa gástrica fome.
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Passado o rio Aporé, eis que estamos em mato Grosso do Sul. Cassilândia dá-me boas vindas, pelo menos no monumento de concreto.
Na rodoviária, pouco movimento naquelas primeiras horas da madrugada. E a lanchonete? Estaria aberta?
Não está!
A fome nova engole a fome velha e as duas conflituam-se no estômago. Pergunto ao condutor do ônibus:
- Onde e quando vamos parar para um café?
- Lá pelas sete, na Lanchonete São Pedro. (Pelo fuso horário local, oito horas de Brasília, o horário de Goiás).
????????????!!!!!!!!!!!!!!!....................
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Por fim, alguns cochilos e a noite já é só sombra na memória. À frente, o trevo. No banco de trás uma senhora com duas filhas.
Minutos após entrarmos na nova rodovia, eis que chegamos ao Posto São Pedro. Percebo que a fome foi tolerada, não morri. Estou vivo.
Na lanchonete do posto conheço a primeira palavra do coloquial sul matogrossense e desconhecida em Goiás. Peço um biscoito de queijo (aquele em forma de ferradura), a garçonete repete em forma de pergunta:
- O senhor quer uma chipa?
- Não. Quero um biscoito de queijo, desse aqui, oh! – indico com o dedo.
- Ah! Uma chipa!
Ainda que com palavras diferentes, percebo que falamos a mesma coisa. Consequência de um país de dimensão continental, com linguagem coloquial diferenciada embora uma só língua. Não temos dialetos como países até menores.
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Pego o biscoito e o como, qual príncipe no melhor de seus banquetes.
Um hora depois chegamos a Campo Grande e pergunto à minha colega de banco (uma evangélica batista, assim como eu):
- Campo Grande já tem rodoviária nova?
- Sim. Acho que vamos descer lá. Quando saí, antes do natal, embarquei na velha, mas a nova já deve ter sido inaugurada.
E, após uma olhadela pela janela do veículo, acrescenta:
- Até que finalmente Campo Grande tem um terminal à altura de sua grandeza. – Diz com ego enaltecido.
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No trajeto urbano passamos por um esqueleto de prédio, mais parecido uma ruína, Letícia – a passageiro ao meu lado - aponta com o dedo:
- Tá vendo aquilo ali?
Afirmo que sim, ela completa:
- É uma vergonha para Campo Grande. Seria uma rodoviária, mas por questiúnculas políticas não foi concluída. Isso faz muitos anos.
- Sei. – Digo sem muita convicção, sem pretender opinar sobre a política local. Mas confirmo que, de outra vez que viera a Campo Grande, já me havia sido informado do fato e mostrado o prédio abandonado. E isso já se transcorreram mais de cinco anos e as ruínas já estavam como estão.
- A nova é um luxo. Fica do outro lado da cidade, perto da Federal.
Pergunto o que é federal, ela explica:
- A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Para decepção de Letícia, na avenida Afonso Pena o ônibus deixa a direção do novo terminal e se converge para a velha rodoviária. Mais tarde fico sabendo que ela se transformará em camelódromo, para desprazer do empresariado de hotelaria das proximidades do velho terminal.
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Letícia tem razão. O velho terminal não condiz com a nova realidade de Campo Grande.
O acesso aos guichês dos ônibus se faz por escadas de concreto, assim como também o acesso dos guichês à única plataforma de embarque, onde os ônibus enfileiram-se de forma indiana, um após o outro.
Sem local definido de embarque exige-se mais atenção dos passageiros, podendo oportunizar perca do ônibus pretendido.
Isso sou alertado por um dono de lanchonete que não esconde a alegria de ser um dos dois únicos do ramo selecionados para continuar com seu trabalho no novo terminal.
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Vale lembrar que acertado ficou desde a inscrição ao encontro que a anfitriã providenciaria que alguém me apanhasse na rodoviária e me levaria ao local do encontro. O horário previsto, entre sete e oito horas da manhã.
Com minha mente condicionada ao horário de Goiás angustia-me o fato de chegar com mais de uma hora de atraso. Estaria provocando grande desconforto para quem estivesse a me esperar.
Entretanto, eis que me lembro de que em Campo Grande o fuso horário é diferente do de Goiás. Na prática tudo se ajeitará, creio, menos por uma razão: eu não irei de imediato para o encontro e sim para a casa de dona Zenaide, mãe de meu genro Ravel, que lá se encontra com a esposa (minha filha Josy Ires) e meu casal de netinhos (Francisco e Anita) e minha filha caçula, Catarina Maria. Estão lá desde a véspera de natal.
Como a programação do encontro só deve começar ao meio dia, vou passar a manhã com minhas filhas e meus netos e, de troco, também com o genro Ravel.
Ravel é professor concursado da Universidade Estadual de Goiás. Nascido no Rio de Janeiro (filho de militar da Marinha), passou a infância na cidade portuária de Corumbá, foi jovem em Campo Grande (onde graduou-se em Letras), cursou mestrado na Unicamp e doutorou-se em teoria da literatura na USP. Iniciou carreira profissional em Goiás, onde casou-se com uma de suas alunas (filha deste escriba).
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Mas como ia dizendo, a coordenação do encontro me buscaria na rodoviária às oito horas. No dia anterior, à tarde e à noite, tentei ligar para Vanda. Em cada tentativa, caixa de mensagem. Nesta manhã nova tentativa, outra vez caixa de mensagem.
Mais tarde venho a saber que no acampamento não tem telefone fixo e celular ficam sem serviço. Só há comunicação telefônica na cidade.
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Ontem ficara acertado que Helena, irmã de meu genro, viria me pegar na rodoviária. Mas... quando? Eis de novo a questão de fusos horários.
A espera na rodoviária foi de uns 30 a 40 minutos, período de tentativa de ligação, para dispensar a condução de Vanda, evitando a perca de uma viagem.
O acampamento fica a cerca de 20 km da cidade e eu não gostaria de provocar desacerto ou constrangimento.
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Os ponteiros passam, ninguém chega. Olho para um lado, para outro, não aparece uma viv’alma. A senhora com as duas meninas que viajara atrás de mim também esperam que alguém venha buscá-las. Já telefonou, estão atrasando. Compartilhamos da sensação da espera, de olhos ligados na direção de chegada dos carros particulares. Ninguém chega.
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Por fim eis que alguém acena do outro lado do terminal em minha direção. Olho para os lados, as outras pessoas, indiferentes, permitem que imagine ser para mim.
Aponto com o dedo para mim, como se a perguntar: “sou eu?”, ela confirma do outro lado da plataforma de chegada dos ônibus para o embarque.
Pego a bagagem, atravesso a dupla plataforma, é Helena. O carro está a uns 50 metros.
Peço-lhe que me permita tentar telefonar para Vanda, a Bugra, nossa anfitriã no acampamento. Por sorte consigo, Bugra informa que seu marido, o Fernando, está a caminho, vem me buscar.
Esclareço a mudança de planos, desculpo-me pelo entrevero, acertamos que não passar das 14 horas, o horário da abertura oficial do evento.
Seguimos para a casa de dona Zenaide, no CoophaSul.
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Ao chegar ao portão, o assédio de Francisco, Chiquinho, ou Chico, o netinho que logo pula-me nos braços e me chama para brincar com ele.
- Vovô Faía, aqui!
Terminei os cumprimentos dos maiores e chegou a vez de Nitinha, a neta Anita. Pego-a nos braços e ela, que sempre festejava comigo, faz beicinho, ameaça um choro de quem estranha, de quem tem medo do desconhecido. Balbucio para ela as expressões de costume, ritmada, quase música:
- Tic, tic, tic.
- Tic, tic, tic.
- Tic, tic, tic. Tic, tic. Tic, tic.
Basta isso para ela reconhecer o avô e sorrir.
Basta também isso para provocar ciúmes em Francisco, que insiste para eu brincar com ele, montar quebra cabeça.
- Vovô Faía, aqui!
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Brinco com ele de “quebra cabeça”, depois vamos para a praça jogar bola na quadra. Ravel e eu jogamos mais que a criança, que se entretém com qualquer coisa.
Após o almoço Catarina e eu vamos ao supermercado onde há um terminal bancário. Sem dinheiro em espécie, retiro algumas cédulas para mim e um pouco também para ela.
De novo na casa de Dona Zenaide, Catarina entrega-me um presente com votos de feliz 2010. Uma caneca térmica “para usar no escritório”, ela diz.
Passa rápido o tempo e começa a chover. A chuva chama-me a atenção para um problema: como ir para o encontro? Sei de um ônibus, mas... onde fica o ponto? Perto de onde estou? Ou do outro lado da cidade?
Ravel conecta-se na internet, descobre que a saída é por essas bandas. Bandas do Rochedo, 35 km. Mas... em que ponto pegar o ônibus?
Por sorte o telefone de Vanda atendeu e veio a confirmação:
- Pegar a VAN às 15 h, no ponto do Goró, na rodovia MS-105, saída para Rochedo. Descer na ponte do Ceroula, na venda de Dona Maria.
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Eis novo problema: como deslocar-me até a rodovia e o ponto referido? Dependo de carro e não quero incomodar Helena, que já teve o trabalho de buscar-me da rodoviária. Também do acampamento não tenho socorro, pois falta condições até de telefonar. Lá estão isolados.
O jeito é apelar para Helena.
E ela, mais uma vez, demonstra-se solícita.
A hora se aproxima, a chuva não para, temos que ir assim mesmo. Catarina vai conosco. A chuva aumenta.
No caminho, paramos em um posto de combustível, pedimos detalhes sobre tal ponto do Goró.
Goró, para nós, tratava-se de um bar, termo associado a excessiva prática da bebida. Tomar um goro, encher a cara, beber todas.
Mas não é. Coró é o nome, e não Goró.
Chegamos com muita chuva.
Dificuldades para descer do carro sem molhar ou para molhar menos. Um senhor cujo nome não sei, coloca-se prestativo, quer me ajudar. E ajuda. Pela janela do carro pega minha mala (sacola) e a coloca em uma mesa. Desço em seguida, molho um pouco, mas feliz por chegar antes da VAN.
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Nova espera, desta feita, pela VAN. Conversa vai, conversa vem, quero saber o porquê do nome Ponte do Ceroula, ninguém sabe explicar.
- Desde sempre foi assim, a gente não teve a curiosidade de perguntar porque.
Aparento entender e aceitar as respostas, mas continuo intrigado. Esse nome deve trazer implícita ou explicita uma boa história.
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Agora quero saber sobre a distância da Ponte do Ceroula e as informações vêm desencontradas: para um, 10km; outro diz 15. Ante as manifestações feitas a distância varia de dez a 50 km.
A desinformação me incomoda, se for 50km e a VAN atrasar, vou perder a solenidade de abertura. Eu, que sai de Goiás e, depois de rodar por durante 9 horas de ônibus, chegar atrasado, não está escrito. É pra acabar com pequis de Goiás. (Ou de Mato Grosso do Sul? Será que por aqui se aprecia pequi?)
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Passa um ônibus, outro, vários. Finalmente chega a VAN com destino ao Rochedo. A metade das pessoas do ponto corre para a porta da VAN. Eu também. A outra metade fica, vai no ônibus, o destino é outro.
Procuro o motorista, desaponta-me a resposta: a VAN está lotada.
Insisto, o motorista enfatiza a resposta:
- Sem chance. – E justifica:
- Se a fiscalização me pegar, tô frito. Daqui a uns 20 ou 30 minutos vem o ônibus, o senhor pega ele.
Volto para debaixo do abrigo do Ponto do Coró, sem caber em mim de tanta indignação.
Cacete! Nadar, nadar, e morrer na praia.
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Sem perspectivas volta o olhar para a VAN. Vejo alguém entrando. Reanimo-me e volto ao motorista. E mais uma vez ele descarta:
- Já disse para o senhor que não posso levar. Mas fala como ele ali, oh! (Aponta para um moço no chão, junto à aporta). O que ele decidir tá decidido. O problema é dele.
Passo para o outro lado da VAN, falo com o dito, que me parece cobrador, ele repete a fala do motorista. Eu insisto, recito meu drama:
- Vim de Goiás para um encontro no Acampamento da Bugra, encontro de escritores, o senhor sabe, né?! Estou representando meu estado, o ônibus pode atrasar e eu não posso perder o início dos trabalhos.
Ele me aponta para o interior da VAN e diz:
- O senhor tá vendo? Não tem lugar. Essas pessoas que tão entrando vão em pé.
Acende-me a esperança e digo logo:
- Sem problema. Eu também vou em pé. Eu não posso é perder o encontro.
Ele pega a mala-sacola, coloca-a na carretinha a reboque da VAN, eu entro com a maleta do notebook
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No interior da VAN, sem dirigir a palavra a alguém em especial, digo a quem queira me ouvir: peço que não me deixem perder o ponto de descida.
“Sim senhor”, diz um; “pó dexá”, afirma outro; “tá certo”, ouço de uma senhora. Todos de minha proximidade apresentam-se solidários, quem nada diz meneia a cabeça em sinal de consentimento ou aprovação.
Pergunto se o acampamento fica perto da ponte, novos desencontros de informação. E as distâncias informadas variam de 300 a 500 metros.
Receio chegar com chuva, caminhar aquela distância a pé, a bagagem na caminhada sempre pesa mais e mais, vou perder a abertura do encontro.
Mas que tudo seja como Deus quiser. Nas mãos dele entrego meu destino.
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Passa a chuva, o Sol brilha.
Entre os passageiros, alguns alertam-me:
- Tá chegando. A venda fica logo ali, na virada da estradinha, logo depois da ponte.
Passa a ponte, desço uns 20 metros à frente.
Olho para os lados, diviso uma estradinha à direita mas não vejo a venda. Enquanto o moço da VAN retira minha sacola da carretinha pergunto-lhe pela venda. Ele levanta o queixo para a frente e aponta:
- Tá logo ali, oh!, na curva da estrada.
Agradeço-lhe, ponho seguidamente um pé na frente do outro e inicio a caminhada.
Os pingos de chuva recomeçam a cair, talvez apenas um chuvisqueiro. Ou estarão a profetizar outro toró? Pelas nuvens no céu tudo pode se esperar.
Caminho com mais pressa e já avisto a venda, uma casa humilde tentando se esconder na beira do córrego do Ceroula, atrás da vegetação ciliar.
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Ao chegar percebo alguns homens a discutir sentados em torno de uma mesa de aço (seria aço ou outro metal?) São quatro.
- Boa tarde, senhores!
Digo em alto e bom som, com voz em timbre mais alto que o dos contendores, enquanto deposito minha bagagem sobre outra mesa ao lado e em uma cadeira também de aço, dessas de abrir e fechar. Em Goiás, cadeira comum em boteco e festa filantrópica, beneficente.
Pergunto quem é o proprietário, um deles se apresenta, e indago se o Acampamento da Bugra é ali perto. Ele confirma: “fica a uns 50 metro, talveiz menos”.
Um deles pergunta-me se sou advogado (talvez porque estou com paletó), ao que eu confirmo e ele diz:
- Nós também!
Sem querer prejulgar duvido da afirmação de ser algum deles advogado, mas não polemizo. Agradeço pela informação sobre o acampamento e o que se apresentou como proprietário chama um jovem, cujo nome não memorizei:
- Ajuda ele!
Imagino tratar-se de filho do gentil senhor. Talvez tivesse se sensibilizado ao ver que carrego essa deficiência física no braço, fruto de estripulia de quando garoto.
Enquanto tento colocar a sacola às costas, feito mochila, referido senhor reitera para o jovem que aparenta despedir-se da adolescência:
- Disse pra você ajudá ele com a mala! Leva ela pra ele até o acampamento!
Dispenso a ajuda, digo que não precisa, ele ajudar-me a colocá-la às costas é suficiente. E ele o faz.
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O Acampamento
Saio da venda e, poucos metros adiante, vislumbro a primeira faixa. Ao me aproximar leio que Dom Fernando dá as boas vindas aos Poetas del Mundo ao Acampamento da Bugra.
Dom Fernando?! Indago a mim próprio sabendo que a resposta só terei no momento oportuno. Será que o Acampamento tem algo a ver com o bispo da capital? É ele, o bispo, também poeta del mundo e está a abençoar o encontro e os encontristas?
A aproximação do acampamento tira-me desse pensar e me coloca por inteiro na nova realidade.
Mais alguns passos, descortino melhor o ambiente, palco de momentos que hão de se tornar memoráveis.
Passo por um prédio fechado (que depois soube tratar de meu alojamento e de mais alguns poetas).
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À frente chama-me a atenção um amplo galpão, onde uma simpatia de senhora dá-me as boas vindas, em nome de Vanda, que no momento encontra-se em uma diligência. Daí não estar ali para me receber, o que ela gostaria muito.
Apresentações feitas, ela se me apresenta como Nena, será a coordenadora do Seminário de Sinestesia.
Desperta-me a curiosidade a forma como Nena chama o fotógrafo para nos fotografar: “Papai”.
Pela idade aparente dos dois, impossível que ele seja pai dela. Mais tarde tudo se esclarece. O tratamento vem de quando nasceu o primeiro filho do casal e tornou-se costume ela chamá-lo de pai ou papai. Esse tratamento, segundo sou informado, é costume entre os gaúchos.
E ele agora é matucho (gaúcho sulmatogrossense). Diz Nena, em tom de brincadeira.
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Um descamisado e havaianas nos pés me é apresentado como Dom Fernando, esposo de Bugra. (Desfaz-se neste instante a dúvida da chegada).
Pouco à frente, uma mesa adornada com galhos verdes de mangueira encimada por uma onça pintada (empalhada) e, debaixo da mesa, uma sucuri também adornada com folhas verdes. Os dois animais, espécimes da fauna da região, dão o tom do temário do encontro: Grito da Terra, Preservar Para Viver.
Na sequência me é apresentado o Rê, artista da terra, compositor e intérprete musical, de nome artístico Reginaldo Sans.
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Outras apresentações feitas: Sônia Medeiros, a “Soninha de Búzios”; Zélia Balbina, a “Zélia de Niterói”; Elaine Mello, a “Elaine de Rio das Ostras”, todas do Estado do Rio de Janeiro. Elas chegaram dois dias antes.
Logo depois chega Olga Fonseca, de Londrina, no Paraná e, à noite, Sabrina Carvalho, da capital paulista. Sabrina, atriz de teatro, também bailarina e cantora. Com ela veio o namorado Diego Adrianne, também músico de Campo Grande.
O dia a dia no acampamento conta ainda com Delasnieve Daspet e seu esposo também escritor, Nelson Vieira, além deste escriba do Cassu de Goiás.
A receptividade e o ambiente-palco do encontro trazem-me arrependimento por ter pensado em dele desistir.
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O que à primeira vista parece-me ponto negativo do encontro, a pequena quantidade de participantes, no decorrer evento converte-se em aspecto positivo, visto que oportuniza a integração do grupo e maior aprofundamento das discussões.
A essas alturas já me dou por recompensados os contratempos de véspera e convenço-me de que muito mais verei para meu deleite e aprimoramento artístico, literário e humano.
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Da programação
Após o credenciamento dos participantes e o que se denominou de “café da roça”, a partir das 17h acontece a terapia do abraço, liderada por Vanda Ferreira, seguindo-se a primeira etapa do seminário de sinestesia com doses de criatividade e experimentação.
Como facilitadora, a poeta Nena do Papai (Sarti).
No Teatro de Arena, junto ao bambuzal à beira do Córrego do Ceroula, dá-se a abertura oficial do evento pela embaixadora dos Poetas del Mundo do Brasil, Delasnieve Daspete que, na intimidade, passa a ser apenas DD.
DD, também embaixadora da Paz do Brasil junto ao Universal Ambassador Peace Circele, faz a apresentação nominal de cada participante, cumprimenta-os nominalmente e agradece pelo trabalho de cada um.
À noite Sabrina agita a emoção de todos com uma performance no teatro de arena.
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De volta ao Galpão acontece o Sarau Literomusical, em nome da Paz, onde e quando acontecem declamações, recitações, interpretação de canções provocativas da saudade de tempos do século passado.
Entre os convidados, outro artística do mundo musical e outros escritores de Campo Grande, inclusive da União Brasileira de Escritores do Estado.
Ainda que o tema oficial do sarau seja amor, as ecléticas peças apresentadas versam sobre temas vários, inclusive de denúncia social.
Com o sarau quebra-se pela primeira vez o protocolo, pois a previsão de toque de silêncio às 23 horas é ignorada, ficando um grupo no galpão cantando, dançando e papeando até cerca de três da madrugada.
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O pouco dormir de alguns não tira o ânimo dos participantes que, na manhã de sábado, logo após o “tira-jejum” no restaurante, partimos em caminhada pelas trilhas na beira do rio Ceroula, todos a contemplar a exuberância da natureza.
Quanto ao rio, o alerta: está interditado em virtude das chuvas, com o volume d’água acima do normal pode ocasionar acidente e isso não interessa a ninguém. Os banhos, portanto, ficam restritos aos chuveiros dos alojamentos.
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Após o passeio livre tem continuidade o Seminário de sinestesia e literatura, com uma parada junto ao bambuzal, que se oferece como motivo de observação e reflexão.
Os participantes recordam ou aprendem os sentidos do ser humano, entre eles visão, tato, olfato, paladar, audição, extrapolação e criação, todos eles pontos fundamentais para a criação poética.
Os estudos são mediante contatos diretos com o ar puro do ambiente, com folha e flores encontradas à beira das trilhas e pequenos animais como borboleta e gafanhoto, além de um ou outro mosquito a beijar coçantemente braços e pernas de poetas e poetas del mundo.
No bosque a atenção maior volta-se para o bambuzal, com analogias enriquecedoras dos participantes, a culminar com textos e frases criativas dos presentes.
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Na arena não falta tempo livre para manifestação de quem tenha interesse. E é aqui que acontece a última etapa do seminário, a partir das 15 horas deste sábado.
Tudo acontece na medida certa, exceto as refeições, quatro por dia, que, por certo, há de provocar alguma briga com as balanças.
No galpão, nos tempos livres da tarde, ao som de musicas ao vivo ou instrumental eletrônico, até uns passos de dança são ensaiados por um ou outro par que não se contém em apenas ouvir.
À atriz Sabrina Carvalho cabe capítulos especiais no encontro: performances diversas, espetáculos teatrais, show de pirofagia e demonstração da estátua viva a encarnar um arcanjo. Em todas suas apresentações Sabrina desperta atenção e curiosidade, privilegiando poses para fotos especiais a quem interesse apresenta.
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À noite novo Sarau e outra vez o protocolo é ignorado, com algumas pessoas buscando a alta madrugada, cantando, declamando, batendo papo.
Domingo, último dia do encontro. Entre outras atividades, sugestões para o manifesto do encontro, depoimento final de cada participante e o pronunciamento da embaixadora Delasnieve.
A extroversão da oradora transforma temas sérios e sisudos em amenidade, um quase bate-papo. Informações, apresentação do calendário de eventos dos Poetas del Mundo, com destaque para o Festival Américxa do Sul , a se realizar em Corumbá, promovido pelo Governo do Estado, quando Poetas del Mundo terá participação especial e presença de nomes internacionalmente reconhecidos.
DD reporta sobre outros encontros programados para 2010, a exemplo dos de Paris (França), Florianópolis, Blumenau, Porto de Galinhas e Goiás, além do Chile, entre outros.
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A embaixadora chama a atenção também para a institucionalização do Movimento Poetas Del Mundo, presente em 119 países dos cinco continentes, com mais de 6 mil associados, dos quais mais de 2 mil no Brasil.
A institucionalização do movimento converge para a criação da Academia Internacional de Poetas del Mundo, com unidade gestora em cada país, cujo nome passa a integrar o título da entidade literária.
Delasnieve ressalta que Movimento Poetas Del Mundo não se destinam a apenas poetas, mas também a prosadores.
Os limites de idade para se tornar associado são relativos, passando o movimento a contar com duas categorias distintas:
- a dos titulares de capacidade jurídica, ou seja, os de maioridade legal;
- e a dos adolescentes e crianças, uma vez que necessário se faz investir também no futuro.
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Com a institucionalização do Movimento e criação da Academia Internacional de Poetas del Mundo, uma diretoria será formada em cada país.
Delasnieve anunciou que, para a diretoria nacional do Brasil a novel entidade já tem alguns nomes: Zélia, do estado do Rio de Janeiro, e este escriba, de Goiás.
Na oportunidade já foram formalizados os dois convites, que foram aceitos, devendo a diretoria ser completada e empossada possivelmente no Festival América do Sul, em Corumbá-MS, em meados do ano em curso.
O poeta de Goiás ocupará o cargo de Secretário e a carioca vai responder pelo setor de elaboração de projetos, área de sua especialidade.
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O I Encontro dos Poetas Del Mundo do Entorno de Campo Grande encerra-se oficialmente com a entrega de certificados do evento e do seminário de sinestesia.
A partir de então já se começa a apertar no peito a saudade e a esperança pela participação do próximo evento dos afeiçoados na apreciação e prática da maior arma da humanidade, a palavra, cujo uso em sua intensidade e significação positivas há de contribuir sobremaneira para a universalização da paz entre os humanos e seu habitat.
José Faria Nunes
Cônsul para o Estado de Goiás
http://www.poetasdelmundo.com/verInfo_america.asp?ID=1812
Cidade Morena: ventura e aventura
Ao som de Reginaldo Sans no PC vejo-me a rememorar os ímpares e inéditos momentos do acampamento rural dos Poetas Del Mundo em Campo Grande, a Cidade Morena do Brasil.
Ventura e aventura nas terras que, entre outras distinções, reverencia a memória de um santo da Igreja Católica de Roma, Dom Bosco, que primou, sobretudo, pela educação em seu país, a Itália, com influência entre seguidores e admiradores por todo o mundo Cristão, inclusive no Brasil. Outro nome lá por muito admirado, Dom Aquino, relembra os tempos em que Mato Grosso do Sul e seu irmão vizinho do norte tinham as mesmas fronteiras, estado uno, embora o sul reivindicasse autonomia, o que chegou na segunda metade do século XX. A exemplo de Dom Bosco, Dom Aquino é também reverenciado na “capital morena” do Brasil.
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Grito da Terra, Preservar para Viver, eis o tema em foco, envolvido também pelo seminário Sinestesia e Poesia.
Na coordenação local do evento, Vanda Ferreira, escudada por Dom Fernando, e, no seminário, a maestria de Nena Sarti, ou “Nena do Papai”.
No comando geral dos Poetas Del Mundo do Brasil, a competência da embaixadora DD-Delasnieve Daspet, com a incondicional parceria de Nelson Vieira, o amigo da comunicação e das letras em Campo Grande e em seu Estado.
O primeiro contato com Bugra, digo, Vanda, foi no encontro de Poetas Del Mundo do Estado de São Paulo, quando do anúncio, por DD, do futuro encontro de Campo Grande. Prometi participação.
Um vez em Goiás, mesmo após ter-me inscrito para o encontro, titubeio. Penso em desistir, deixar de participar, até porque pouco ou quase nada tenho a contribuir. E não é de meu feitio ser apenas número, preenchimento de colunas da estatística.
Chego a anunciar minha quase não ida, mas dois nomes condicionam-me a não desistir: Vanda, cônsul dos Poetas del Mundo do Entorno de Campo Grande, a anfitriã do evento, e Delasnieve, a embaixadora dos Poetas del Mundo do Brasil, cuja ação e atuação, por si só, inspiram a arregaçar as mangas quem com ela convive.
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Bilhete no bolso, partida do ônibus anunciada para as 22h20.
Como já se estigmatizou que brasileiro deixa sempre algo de importância para a última hora, faço jus ao clichê.
Detalhes de malas e bagagem com providências de última hora, fica para trás o lanche preparado para a matula na viagem. Sei de antemão que a lanchonete da rodoviária, a essas alturas, deve estar fechada. Como não jantei, sem lanche vou passar fome.
Antes de Mato Grosso do Sul, passaremos por duas cidades (Itarumã e Itajá), cujas lanchonetes também estarão fechadas quando lá chegarmos, fato comum em cidade pequena do interior de Goiás. Expectativa de lanche só em Cassilândia, em Mato Grosso do Sul.
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À guisa de frasqueira de mão, a maleta-estojo do computador portátil (que, por força alienígena da colonização imperialista, se reconhece por notebook, literalmente livro ou caderno de anotações).
A mala de viagem eu a emprestei para Catarina Maria, a filha que fora passar o natal e a virada do ano com a sogra de minha filha Josy Ires.
Improviso como mala a sacola com rodas e, pelas ruas, arrasto-a por umas cinco quadras até a rodoviária.
Feliz a invenção de rodas em malas e sacolas.
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A aventura promete agito de adrenalina a partir do atraso do ônibus da linha Brasília-Campo Grande com escala em Caçu (ou Cassu?).
Aos primeiros minutos de atraso, compreensível tolerância, que se esvai à medida em que os ponteiros registram a ampliação do atraso.
Dez, vinte, trinta minutos e nada de ônibus. Passageiros que viajariam mais tarde, um após outro, embarcam-se e partem (embarcar não é entrar no barco?). Eu, com o bilhete no bolso, ainda a esperar. E a fome a aumentar.
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A agente do guichê do ônibus encoraja-me a me deslocar até meu escritório, onde esqueci o lanche preparado para a viagem. Se nesse ínterim chegar o ônibus ela o fará esperar por mim.
Chamo um mototaxista (mesmo não apreciando essa estrovenga de duas rodas), sento-me na garupa e zarpamos.
Já à porta do escritório, a desencorajadora lembrança: a chave havia ficado na mala, na rodoviária. E então, adeus lanche!
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De volta na mesma moto, algumas tentativas por alguns bares da cidade.
Talvez compre um pacote de bolachas, preferencialmente salgadas, porém, na falta desta, qualquer outra serve.
Um bar, outro bar, um terceiro... nada para se comer encontro em nenhum deles. E a fome a aumentar.
Decepção: que cidade é essa em que só se vende cachaça ou cerveja nessa hora da noite?
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De novo na rodoviária, a continuada espera. Os ponteiros denunciam mais de uma hora de atraso.
Passados uma hora e meia, eis que chaga o ônibus. Ufa!
Até que finalmente vejo-me de saída, com esperança de lanchar em Cassilândia.
Acomodo-me na poltrona 13, naquela hora já na sexta feira do dia 8 (e se fosse dia 13?).
Ajeito o protetor de pescoço para tentar dormir. Com isso tento tapear a fome.
Mas não durmo. Ficam para trás o rio Verdinho, Itarumã, o rio Corrente, Itajá. Tudo passa, menos a fome.
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O descortinar das luzes de Cassilândia mexe com o estômago. Como se diz na sinestesia, já percebo o cheiro e o sabor de iguarias que hão de me matar a fome. Salgados, sanduíches, bolachas, biscoitos, qualquer coisa.
Caso não tenha suco natural, sem problema. Agrada-me também guaraná e até água mineral recebo de bom grado. Qualquer coisa que me ajude no processo de ingestão. Porém, na falta de líquido, o lanche vem bem até mesmo seco. Não quero é essa gástrica fome.
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Passado o rio Aporé, eis que estamos em mato Grosso do Sul. Cassilândia dá-me boas vindas, pelo menos no monumento de concreto.
Na rodoviária, pouco movimento naquelas primeiras horas da madrugada. E a lanchonete? Estaria aberta?
Não está!
A fome nova engole a fome velha e as duas conflituam-se no estômago. Pergunto ao condutor do ônibus:
- Onde e quando vamos parar para um café?
- Lá pelas sete, na Lanchonete São Pedro. (Pelo fuso horário local, oito horas de Brasília, o horário de Goiás).
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Por fim, alguns cochilos e a noite já é só sombra na memória. À frente, o trevo. No banco de trás uma senhora com duas filhas.
Minutos após entrarmos na nova rodovia, eis que chegamos ao Posto São Pedro. Percebo que a fome foi tolerada, não morri. Estou vivo.
Na lanchonete do posto conheço a primeira palavra do coloquial sul matogrossense e desconhecida em Goiás. Peço um biscoito de queijo (aquele em forma de ferradura), a garçonete repete em forma de pergunta:
- O senhor quer uma chipa?
- Não. Quero um biscoito de queijo, desse aqui, oh! – indico com o dedo.
- Ah! Uma chipa!
Ainda que com palavras diferentes, percebo que falamos a mesma coisa. Consequência de um país de dimensão continental, com linguagem coloquial diferenciada embora uma só língua. Não temos dialetos como países até menores.
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Pego o biscoito e o como, qual príncipe no melhor de seus banquetes.
Um hora depois chegamos a Campo Grande e pergunto à minha colega de banco (uma evangélica batista, assim como eu):
- Campo Grande já tem rodoviária nova?
- Sim. Acho que vamos descer lá. Quando saí, antes do natal, embarquei na velha, mas a nova já deve ter sido inaugurada.
E, após uma olhadela pela janela do veículo, acrescenta:
- Até que finalmente Campo Grande tem um terminal à altura de sua grandeza. – Diz com ego enaltecido.
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No trajeto urbano passamos por um esqueleto de prédio, mais parecido uma ruína, Letícia – a passageiro ao meu lado - aponta com o dedo:
- Tá vendo aquilo ali?
Afirmo que sim, ela completa:
- É uma vergonha para Campo Grande. Seria uma rodoviária, mas por questiúnculas políticas não foi concluída. Isso faz muitos anos.
- Sei. – Digo sem muita convicção, sem pretender opinar sobre a política local. Mas confirmo que, de outra vez que viera a Campo Grande, já me havia sido informado do fato e mostrado o prédio abandonado. E isso já se transcorreram mais de cinco anos e as ruínas já estavam como estão.
- A nova é um luxo. Fica do outro lado da cidade, perto da Federal.
Pergunto o que é federal, ela explica:
- A Universidade Federal de Mato Grosso do Sul.
Para decepção de Letícia, na avenida Afonso Pena o ônibus deixa a direção do novo terminal e se converge para a velha rodoviária. Mais tarde fico sabendo que ela se transformará em camelódromo, para desprazer do empresariado de hotelaria das proximidades do velho terminal.
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Letícia tem razão. O velho terminal não condiz com a nova realidade de Campo Grande.
O acesso aos guichês dos ônibus se faz por escadas de concreto, assim como também o acesso dos guichês à única plataforma de embarque, onde os ônibus enfileiram-se de forma indiana, um após o outro.
Sem local definido de embarque exige-se mais atenção dos passageiros, podendo oportunizar perca do ônibus pretendido.
Isso sou alertado por um dono de lanchonete que não esconde a alegria de ser um dos dois únicos do ramo selecionados para continuar com seu trabalho no novo terminal.
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Vale lembrar que acertado ficou desde a inscrição ao encontro que a anfitriã providenciaria que alguém me apanhasse na rodoviária e me levaria ao local do encontro. O horário previsto, entre sete e oito horas da manhã.
Com minha mente condicionada ao horário de Goiás angustia-me o fato de chegar com mais de uma hora de atraso. Estaria provocando grande desconforto para quem estivesse a me esperar.
Entretanto, eis que me lembro de que em Campo Grande o fuso horário é diferente do de Goiás. Na prática tudo se ajeitará, creio, menos por uma razão: eu não irei de imediato para o encontro e sim para a casa de dona Zenaide, mãe de meu genro Ravel, que lá se encontra com a esposa (minha filha Josy Ires) e meu casal de netinhos (Francisco e Anita) e minha filha caçula, Catarina Maria. Estão lá desde a véspera de natal.
Como a programação do encontro só deve começar ao meio dia, vou passar a manhã com minhas filhas e meus netos e, de troco, também com o genro Ravel.
Ravel é professor concursado da Universidade Estadual de Goiás. Nascido no Rio de Janeiro (filho de militar da Marinha), passou a infância na cidade portuária de Corumbá, foi jovem em Campo Grande (onde graduou-se em Letras), cursou mestrado na Unicamp e doutorou-se em teoria da literatura na USP. Iniciou carreira profissional em Goiás, onde casou-se com uma de suas alunas (filha deste escriba).
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Mas como ia dizendo, a coordenação do encontro me buscaria na rodoviária às oito horas. No dia anterior, à tarde e à noite, tentei ligar para Vanda. Em cada tentativa, caixa de mensagem. Nesta manhã nova tentativa, outra vez caixa de mensagem.
Mais tarde venho a saber que no acampamento não tem telefone fixo e celular ficam sem serviço. Só há comunicação telefônica na cidade.
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Ontem ficara acertado que Helena, irmã de meu genro, viria me pegar na rodoviária. Mas... quando? Eis de novo a questão de fusos horários.
A espera na rodoviária foi de uns 30 a 40 minutos, período de tentativa de ligação, para dispensar a condução de Vanda, evitando a perca de uma viagem.
O acampamento fica a cerca de 20 km da cidade e eu não gostaria de provocar desacerto ou constrangimento.
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Os ponteiros passam, ninguém chega. Olho para um lado, para outro, não aparece uma viv’alma. A senhora com as duas meninas que viajara atrás de mim também esperam que alguém venha buscá-las. Já telefonou, estão atrasando. Compartilhamos da sensação da espera, de olhos ligados na direção de chegada dos carros particulares. Ninguém chega.
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Por fim eis que alguém acena do outro lado do terminal em minha direção. Olho para os lados, as outras pessoas, indiferentes, permitem que imagine ser para mim.
Aponto com o dedo para mim, como se a perguntar: “sou eu?”, ela confirma do outro lado da plataforma de chegada dos ônibus para o embarque.
Pego a bagagem, atravesso a dupla plataforma, é Helena. O carro está a uns 50 metros.
Peço-lhe que me permita tentar telefonar para Vanda, a Bugra, nossa anfitriã no acampamento. Por sorte consigo, Bugra informa que seu marido, o Fernando, está a caminho, vem me buscar.
Esclareço a mudança de planos, desculpo-me pelo entrevero, acertamos que não passar das 14 horas, o horário da abertura oficial do evento.
Seguimos para a casa de dona Zenaide, no CoophaSul.
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Ao chegar ao portão, o assédio de Francisco, Chiquinho, ou Chico, o netinho que logo pula-me nos braços e me chama para brincar com ele.
- Vovô Faía, aqui!
Terminei os cumprimentos dos maiores e chegou a vez de Nitinha, a neta Anita. Pego-a nos braços e ela, que sempre festejava comigo, faz beicinho, ameaça um choro de quem estranha, de quem tem medo do desconhecido. Balbucio para ela as expressões de costume, ritmada, quase música:
- Tic, tic, tic.
- Tic, tic, tic.
- Tic, tic, tic. Tic, tic. Tic, tic.
Basta isso para ela reconhecer o avô e sorrir.
Basta também isso para provocar ciúmes em Francisco, que insiste para eu brincar com ele, montar quebra cabeça.
- Vovô Faía, aqui!
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Brinco com ele de “quebra cabeça”, depois vamos para a praça jogar bola na quadra. Ravel e eu jogamos mais que a criança, que se entretém com qualquer coisa.
Após o almoço Catarina e eu vamos ao supermercado onde há um terminal bancário. Sem dinheiro em espécie, retiro algumas cédulas para mim e um pouco também para ela.
De novo na casa de Dona Zenaide, Catarina entrega-me um presente com votos de feliz 2010. Uma caneca térmica “para usar no escritório”, ela diz.
Passa rápido o tempo e começa a chover. A chuva chama-me a atenção para um problema: como ir para o encontro? Sei de um ônibus, mas... onde fica o ponto? Perto de onde estou? Ou do outro lado da cidade?
Ravel conecta-se na internet, descobre que a saída é por essas bandas. Bandas do Rochedo, 35 km. Mas... em que ponto pegar o ônibus?
Por sorte o telefone de Vanda atendeu e veio a confirmação:
- Pegar a VAN às 15 h, no ponto do Goró, na rodovia MS-105, saída para Rochedo. Descer na ponte do Ceroula, na venda de Dona Maria.
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Eis novo problema: como deslocar-me até a rodovia e o ponto referido? Dependo de carro e não quero incomodar Helena, que já teve o trabalho de buscar-me da rodoviária. Também do acampamento não tenho socorro, pois falta condições até de telefonar. Lá estão isolados.
O jeito é apelar para Helena.
E ela, mais uma vez, demonstra-se solícita.
A hora se aproxima, a chuva não para, temos que ir assim mesmo. Catarina vai conosco. A chuva aumenta.
No caminho, paramos em um posto de combustível, pedimos detalhes sobre tal ponto do Goró.
Goró, para nós, tratava-se de um bar, termo associado a excessiva prática da bebida. Tomar um goro, encher a cara, beber todas.
Mas não é. Coró é o nome, e não Goró.
Chegamos com muita chuva.
Dificuldades para descer do carro sem molhar ou para molhar menos. Um senhor cujo nome não sei, coloca-se prestativo, quer me ajudar. E ajuda. Pela janela do carro pega minha mala (sacola) e a coloca em uma mesa. Desço em seguida, molho um pouco, mas feliz por chegar antes da VAN.
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Nova espera, desta feita, pela VAN. Conversa vai, conversa vem, quero saber o porquê do nome Ponte do Ceroula, ninguém sabe explicar.
- Desde sempre foi assim, a gente não teve a curiosidade de perguntar porque.
Aparento entender e aceitar as respostas, mas continuo intrigado. Esse nome deve trazer implícita ou explicita uma boa história.
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Agora quero saber sobre a distância da Ponte do Ceroula e as informações vêm desencontradas: para um, 10km; outro diz 15. Ante as manifestações feitas a distância varia de dez a 50 km.
A desinformação me incomoda, se for 50km e a VAN atrasar, vou perder a solenidade de abertura. Eu, que sai de Goiás e, depois de rodar por durante 9 horas de ônibus, chegar atrasado, não está escrito. É pra acabar com pequis de Goiás. (Ou de Mato Grosso do Sul? Será que por aqui se aprecia pequi?)
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Passa um ônibus, outro, vários. Finalmente chega a VAN com destino ao Rochedo. A metade das pessoas do ponto corre para a porta da VAN. Eu também. A outra metade fica, vai no ônibus, o destino é outro.
Procuro o motorista, desaponta-me a resposta: a VAN está lotada.
Insisto, o motorista enfatiza a resposta:
- Sem chance. – E justifica:
- Se a fiscalização me pegar, tô frito. Daqui a uns 20 ou 30 minutos vem o ônibus, o senhor pega ele.
Volto para debaixo do abrigo do Ponto do Coró, sem caber em mim de tanta indignação.
Cacete! Nadar, nadar, e morrer na praia.
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Sem perspectivas volta o olhar para a VAN. Vejo alguém entrando. Reanimo-me e volto ao motorista. E mais uma vez ele descarta:
- Já disse para o senhor que não posso levar. Mas fala como ele ali, oh! (Aponta para um moço no chão, junto à aporta). O que ele decidir tá decidido. O problema é dele.
Passo para o outro lado da VAN, falo com o dito, que me parece cobrador, ele repete a fala do motorista. Eu insisto, recito meu drama:
- Vim de Goiás para um encontro no Acampamento da Bugra, encontro de escritores, o senhor sabe, né?! Estou representando meu estado, o ônibus pode atrasar e eu não posso perder o início dos trabalhos.
Ele me aponta para o interior da VAN e diz:
- O senhor tá vendo? Não tem lugar. Essas pessoas que tão entrando vão em pé.
Acende-me a esperança e digo logo:
- Sem problema. Eu também vou em pé. Eu não posso é perder o encontro.
Ele pega a mala-sacola, coloca-a na carretinha a reboque da VAN, eu entro com a maleta do notebook
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No interior da VAN, sem dirigir a palavra a alguém em especial, digo a quem queira me ouvir: peço que não me deixem perder o ponto de descida.
“Sim senhor”, diz um; “pó dexá”, afirma outro; “tá certo”, ouço de uma senhora. Todos de minha proximidade apresentam-se solidários, quem nada diz meneia a cabeça em sinal de consentimento ou aprovação.
Pergunto se o acampamento fica perto da ponte, novos desencontros de informação. E as distâncias informadas variam de 300 a 500 metros.
Receio chegar com chuva, caminhar aquela distância a pé, a bagagem na caminhada sempre pesa mais e mais, vou perder a abertura do encontro.
Mas que tudo seja como Deus quiser. Nas mãos dele entrego meu destino.
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Passa a chuva, o Sol brilha.
Entre os passageiros, alguns alertam-me:
- Tá chegando. A venda fica logo ali, na virada da estradinha, logo depois da ponte.
Passa a ponte, desço uns 20 metros à frente.
Olho para os lados, diviso uma estradinha à direita mas não vejo a venda. Enquanto o moço da VAN retira minha sacola da carretinha pergunto-lhe pela venda. Ele levanta o queixo para a frente e aponta:
- Tá logo ali, oh!, na curva da estrada.
Agradeço-lhe, ponho seguidamente um pé na frente do outro e inicio a caminhada.
Os pingos de chuva recomeçam a cair, talvez apenas um chuvisqueiro. Ou estarão a profetizar outro toró? Pelas nuvens no céu tudo pode se esperar.
Caminho com mais pressa e já avisto a venda, uma casa humilde tentando se esconder na beira do córrego do Ceroula, atrás da vegetação ciliar.
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Ao chegar percebo alguns homens a discutir sentados em torno de uma mesa de aço (seria aço ou outro metal?) São quatro.
- Boa tarde, senhores!
Digo em alto e bom som, com voz em timbre mais alto que o dos contendores, enquanto deposito minha bagagem sobre outra mesa ao lado e em uma cadeira também de aço, dessas de abrir e fechar. Em Goiás, cadeira comum em boteco e festa filantrópica, beneficente.
Pergunto quem é o proprietário, um deles se apresenta, e indago se o Acampamento da Bugra é ali perto. Ele confirma: “fica a uns 50 metro, talveiz menos”.
Um deles pergunta-me se sou advogado (talvez porque estou com paletó), ao que eu confirmo e ele diz:
- Nós também!
Sem querer prejulgar duvido da afirmação de ser algum deles advogado, mas não polemizo. Agradeço pela informação sobre o acampamento e o que se apresentou como proprietário chama um jovem, cujo nome não memorizei:
- Ajuda ele!
Imagino tratar-se de filho do gentil senhor. Talvez tivesse se sensibilizado ao ver que carrego essa deficiência física no braço, fruto de estripulia de quando garoto.
Enquanto tento colocar a sacola às costas, feito mochila, referido senhor reitera para o jovem que aparenta despedir-se da adolescência:
- Disse pra você ajudá ele com a mala! Leva ela pra ele até o acampamento!
Dispenso a ajuda, digo que não precisa, ele ajudar-me a colocá-la às costas é suficiente. E ele o faz.
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O Acampamento
Saio da venda e, poucos metros adiante, vislumbro a primeira faixa. Ao me aproximar leio que Dom Fernando dá as boas vindas aos Poetas del Mundo ao Acampamento da Bugra.
Dom Fernando?! Indago a mim próprio sabendo que a resposta só terei no momento oportuno. Será que o Acampamento tem algo a ver com o bispo da capital? É ele, o bispo, também poeta del mundo e está a abençoar o encontro e os encontristas?
A aproximação do acampamento tira-me desse pensar e me coloca por inteiro na nova realidade.
Mais alguns passos, descortino melhor o ambiente, palco de momentos que hão de se tornar memoráveis.
Passo por um prédio fechado (que depois soube tratar de meu alojamento e de mais alguns poetas).
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À frente chama-me a atenção um amplo galpão, onde uma simpatia de senhora dá-me as boas vindas, em nome de Vanda, que no momento encontra-se em uma diligência. Daí não estar ali para me receber, o que ela gostaria muito.
Apresentações feitas, ela se me apresenta como Nena, será a coordenadora do Seminário de Sinestesia.
Desperta-me a curiosidade a forma como Nena chama o fotógrafo para nos fotografar: “Papai”.
Pela idade aparente dos dois, impossível que ele seja pai dela. Mais tarde tudo se esclarece. O tratamento vem de quando nasceu o primeiro filho do casal e tornou-se costume ela chamá-lo de pai ou papai. Esse tratamento, segundo sou informado, é costume entre os gaúchos.
E ele agora é matucho (gaúcho sulmatogrossense). Diz Nena, em tom de brincadeira.
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Um descamisado e havaianas nos pés me é apresentado como Dom Fernando, esposo de Bugra. (Desfaz-se neste instante a dúvida da chegada).
Pouco à frente, uma mesa adornada com galhos verdes de mangueira encimada por uma onça pintada (empalhada) e, debaixo da mesa, uma sucuri também adornada com folhas verdes. Os dois animais, espécimes da fauna da região, dão o tom do temário do encontro: Grito da Terra, Preservar Para Viver.
Na sequência me é apresentado o Rê, artista da terra, compositor e intérprete musical, de nome artístico Reginaldo Sans.
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Outras apresentações feitas: Sônia Medeiros, a “Soninha de Búzios”; Zélia Balbina, a “Zélia de Niterói”; Elaine Mello, a “Elaine de Rio das Ostras”, todas do Estado do Rio de Janeiro. Elas chegaram dois dias antes.
Logo depois chega Olga Fonseca, de Londrina, no Paraná e, à noite, Sabrina Carvalho, da capital paulista. Sabrina, atriz de teatro, também bailarina e cantora. Com ela veio o namorado Diego Adrianne, também músico de Campo Grande.
O dia a dia no acampamento conta ainda com Delasnieve Daspet e seu esposo também escritor, Nelson Vieira, além deste escriba do Cassu de Goiás.
A receptividade e o ambiente-palco do encontro trazem-me arrependimento por ter pensado em dele desistir.
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O que à primeira vista parece-me ponto negativo do encontro, a pequena quantidade de participantes, no decorrer evento converte-se em aspecto positivo, visto que oportuniza a integração do grupo e maior aprofundamento das discussões.
A essas alturas já me dou por recompensados os contratempos de véspera e convenço-me de que muito mais verei para meu deleite e aprimoramento artístico, literário e humano.
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Da programação
Após o credenciamento dos participantes e o que se denominou de “café da roça”, a partir das 17h acontece a terapia do abraço, liderada por Vanda Ferreira, seguindo-se a primeira etapa do seminário de sinestesia com doses de criatividade e experimentação.
Como facilitadora, a poeta Nena do Papai (Sarti).
No Teatro de Arena, junto ao bambuzal à beira do Córrego do Ceroula, dá-se a abertura oficial do evento pela embaixadora dos Poetas del Mundo do Brasil, Delasnieve Daspete que, na intimidade, passa a ser apenas DD.
DD, também embaixadora da Paz do Brasil junto ao Universal Ambassador Peace Circele, faz a apresentação nominal de cada participante, cumprimenta-os nominalmente e agradece pelo trabalho de cada um.
À noite Sabrina agita a emoção de todos com uma performance no teatro de arena.
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De volta ao Galpão acontece o Sarau Literomusical, em nome da Paz, onde e quando acontecem declamações, recitações, interpretação de canções provocativas da saudade de tempos do século passado.
Entre os convidados, outro artística do mundo musical e outros escritores de Campo Grande, inclusive da União Brasileira de Escritores do Estado.
Ainda que o tema oficial do sarau seja amor, as ecléticas peças apresentadas versam sobre temas vários, inclusive de denúncia social.
Com o sarau quebra-se pela primeira vez o protocolo, pois a previsão de toque de silêncio às 23 horas é ignorada, ficando um grupo no galpão cantando, dançando e papeando até cerca de três da madrugada.
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O pouco dormir de alguns não tira o ânimo dos participantes que, na manhã de sábado, logo após o “tira-jejum” no restaurante, partimos em caminhada pelas trilhas na beira do rio Ceroula, todos a contemplar a exuberância da natureza.
Quanto ao rio, o alerta: está interditado em virtude das chuvas, com o volume d’água acima do normal pode ocasionar acidente e isso não interessa a ninguém. Os banhos, portanto, ficam restritos aos chuveiros dos alojamentos.
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Após o passeio livre tem continuidade o Seminário de sinestesia e literatura, com uma parada junto ao bambuzal, que se oferece como motivo de observação e reflexão.
Os participantes recordam ou aprendem os sentidos do ser humano, entre eles visão, tato, olfato, paladar, audição, extrapolação e criação, todos eles pontos fundamentais para a criação poética.
Os estudos são mediante contatos diretos com o ar puro do ambiente, com folha e flores encontradas à beira das trilhas e pequenos animais como borboleta e gafanhoto, além de um ou outro mosquito a beijar coçantemente braços e pernas de poetas e poetas del mundo.
No bosque a atenção maior volta-se para o bambuzal, com analogias enriquecedoras dos participantes, a culminar com textos e frases criativas dos presentes.
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Na arena não falta tempo livre para manifestação de quem tenha interesse. E é aqui que acontece a última etapa do seminário, a partir das 15 horas deste sábado.
Tudo acontece na medida certa, exceto as refeições, quatro por dia, que, por certo, há de provocar alguma briga com as balanças.
No galpão, nos tempos livres da tarde, ao som de musicas ao vivo ou instrumental eletrônico, até uns passos de dança são ensaiados por um ou outro par que não se contém em apenas ouvir.
À atriz Sabrina Carvalho cabe capítulos especiais no encontro: performances diversas, espetáculos teatrais, show de pirofagia e demonstração da estátua viva a encarnar um arcanjo. Em todas suas apresentações Sabrina desperta atenção e curiosidade, privilegiando poses para fotos especiais a quem interesse apresenta.
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À noite novo Sarau e outra vez o protocolo é ignorado, com algumas pessoas buscando a alta madrugada, cantando, declamando, batendo papo.
Domingo, último dia do encontro. Entre outras atividades, sugestões para o manifesto do encontro, depoimento final de cada participante e o pronunciamento da embaixadora Delasnieve.
A extroversão da oradora transforma temas sérios e sisudos em amenidade, um quase bate-papo. Informações, apresentação do calendário de eventos dos Poetas del Mundo, com destaque para o Festival Américxa do Sul , a se realizar em Corumbá, promovido pelo Governo do Estado, quando Poetas del Mundo terá participação especial e presença de nomes internacionalmente reconhecidos.
DD reporta sobre outros encontros programados para 2010, a exemplo dos de Paris (França), Florianópolis, Blumenau, Porto de Galinhas e Goiás, além do Chile, entre outros.
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A embaixadora chama a atenção também para a institucionalização do Movimento Poetas Del Mundo, presente em 119 países dos cinco continentes, com mais de 6 mil associados, dos quais mais de 2 mil no Brasil.
A institucionalização do movimento converge para a criação da Academia Internacional de Poetas del Mundo, com unidade gestora em cada país, cujo nome passa a integrar o título da entidade literária.
Delasnieve ressalta que Movimento Poetas Del Mundo não se destinam a apenas poetas, mas também a prosadores.
Os limites de idade para se tornar associado são relativos, passando o movimento a contar com duas categorias distintas:
- a dos titulares de capacidade jurídica, ou seja, os de maioridade legal;
- e a dos adolescentes e crianças, uma vez que necessário se faz investir também no futuro.
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Com a institucionalização do Movimento e criação da Academia Internacional de Poetas del Mundo, uma diretoria será formada em cada país.
Delasnieve anunciou que, para a diretoria nacional do Brasil a novel entidade já tem alguns nomes: Zélia, do estado do Rio de Janeiro, e este escriba, de Goiás.
Na oportunidade já foram formalizados os dois convites, que foram aceitos, devendo a diretoria ser completada e empossada possivelmente no Festival América do Sul, em Corumbá-MS, em meados do ano em curso.
O poeta de Goiás ocupará o cargo de Secretário e a carioca vai responder pelo setor de elaboração de projetos, área de sua especialidade.
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O I Encontro dos Poetas Del Mundo do Entorno de Campo Grande encerra-se oficialmente com a entrega de certificados do evento e do seminário de sinestesia.
A partir de então já se começa a apertar no peito a saudade e a esperança pela participação do próximo evento dos afeiçoados na apreciação e prática da maior arma da humanidade, a palavra, cujo uso em sua intensidade e significação positivas há de contribuir sobremaneira para a universalização da paz entre os humanos e seu habitat.
José Faria Nunes
Cônsul para o Estado de Goiás
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1º acampamento,
bugra,
de Poetas Del Mundo,
Faria,
GO,
vanda ferreira
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